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José Marques de Melo*
O diploma não era obrigatório, quando, há meio século, ingressei no exercício da profissão. Aprendi a fazer notícias e comentários, capitalizando a experiência do leitor atento que sempre fui, além de observar as rotinas de trabalho vigentes na redação. Assimilei naturalmente as lições ditadas, no Jornal de Alagoas, pelo meu editor, Carvalho Veras, nutrindo-me ainda na escassa literatura então existente sobre a matéria.
Mas cedo percebi que a prática era limitada e o autodidatismo insuficiente. Resolvi estudar jornalismo na universidade. Foi a decisão mais acertada que poderia tomar. Depois, quis saber se a teoria aprendida se aplicava à realidade. Isso foi possível através do estágio no jornal Última Hora – Nordeste e na Rádio Universitária do Recife. Também me beneficiei da iniciação científica feita no Instituo de Ciências da Informação – ICINFORM, útil para refinar a apuração dos fatos e necessária para sua interpretação.
Já me encontrava em São Paulo, no auge da carreira, quando o diploma foi decretado. Providência salutar para o saneamento da profissão, invadida por oportunistas. Estes só queriam beneficiar-se da isenção tributária sobre a renda ou ter desconto em viagens aéreas e outras vantagens concedidas aos jornalistas. Tais privilégios foram abolidos, desaparecendo o encanto que seduzia os arrivistas.
Com a profissionalização das empresas, o jornalismo deixou de ser bico, requerendo jornada em tempo integral. Melhores salários e mais oportunidades de trabalho contribuíram para multiplicar os cursos de jornalismo. As políticas públicas de fomento aos laboratórios didáticos e a vigilância do Estado em relação à competência dos professores elevaram a qualidade do ensino. Mas isso não se deu uniformemente em todo o território nacional. Os processos de avaliação periódica foram decisivos para separar as boas escolas daquelas ruins, que se converteram em autênticas “fábricas de diplomas”.
Fator negativo foi a proibição do estágio, distanciado os estudantes de jornalismo do mercado de trabalho. Por outro lado, a radicalização das posições, nas entidades sindicais, tanto dos trabalhadores quanto do patronato, a propósito da formação de jornalistas especializados, produziu uma brecha ocupacional que se foi alargando com o tempo. A necessidade de contratação de profissionais de outras áreas do conhecimento para reforçar as editoriais de finanças, política internacional, ciência, cultura e tecnologia, esbarrava na lei do diploma, que requeria a graduação específica. Em outros países, esse impasse foi solucionado através da diplomação em cursos pós-graduados.
O Supremo Tribunal Federal, ao invés de aperfeiçoar a legislação vigente, corrigindo distorções, regulando adequadamente as relações de trabalho nas empresas e contribuindo para a melhor qualificação profissional nas universidades, adotou medida extrema. Aboliu simplesmente a exigência do diploma de nível superior para o exercício da profissão de jornalista. Trata-se de retrocesso perigoso, que pode infestar o mercado de trabalho de aventureiros. Penetrando através dos flancos eventualmente abertos por empresas que não se pautam pela responsabilidade social, eles podem frustrar o direito da sociedade à informação veraz e à opinião abalizada.
No vácuo existente, torna-se decisivo o papel a ser desempenhado pelas universidades. Primando pela melhoria da qualidade do ensino e formando jornalistas competentes e competitivos, em sintonia com as demandas da sociedade, elas poderão contribuir para neutralizar conflitos e harmonizar providências de interesse público.
A sociedade brasileira atravessa conjuntura peculiar e sinaliza um novo tipo de jornalismo. Por um lado, abastecendo as elites de informações especializadas, que aprofundem a interpretação dos fatos e ajudem suas vanguardas a tomar decisões estratégicas. Mas, por outro lado, nutrindo os grandes contingentes da população de informações gerais, capazes de fortalecer a cidadania e sedimentar a democracia. Trata-se de corresponder às carências cognitivas dos famintos de cultura e sedentos de valores éticos, espalhados pelos grotões e periferias de todo o país.
Avulta, portanto, o compromisso das escolas de jornalismo, reestruturadas, a partir do próximo ano, de acordo com as diretrizes instituídas pelo Ministério da Educação, subsidiando a formação de uma nova geração de profissionais competentes, empreendedores, criativos e responsáveis.
*Presidente da Comissão de Especialistas em Ensino de Jornalismo do Ministério da Educação. Docente fundador da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, ocupa atualmente o cargo de Diretor da Cátedra UNESCO de Comunicação da Universidade Metodista de São Paulo. Autor das recentes obras: Vestígios da travessia: da imprensa à internet (Paulus/Edufal), Jornalismo, forma e conteúdo (Difusão) e Jornalismo, compreensão e reinvenção (Saraiva).
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